Nesse momento Tomagoshi dá uma pesada na porta de segurança máxima que se abre sem a mínima força. Do interior uma paz espiritual ecoou ao som de um encorpado mantra hindu e um suave aroma de sândalo proveniente do incensário monumental.
- Que paz – contempla o Sargento.
- Saudações, Mestre! – diz Tomagoshi ao entrar.
- Que cheiro de merda é esse? – pergunta o Tenente.
Dán dân. Dán dân. Dán dán dán, dân dân dân, dân dân. Dán dân dân. Dán dân dân. Dân dân dân dân...
Tratava-se do Templo. Na realidade a sala de administração do complexo industrial. Um grande espaço místico adornado ao mais oriental estilo Japonês. Néons e letreiros luminosos da Honda, Yamaha, Sony, Aiko, Fujtisu, Mitsubishi, Kodak e outras potencias do sol nascente a dividir o mesmo espaço com leques, luminárias de papel, penduricalhos de bambu e demais origamis. Sentado numa enorme cadeira Luis XV aos pés do grande obelisco de Buda, o Presidente da fábrica, Líder espiritual da turma, Chefe de torcida e Técnico do time de beisebol local, o Numsei Mijaru Nakombi, saúda os visitantes e lhes dá as boas vindas....
Dán dân. Dán dân. Dán dán dán, dân dân dân, dân dân. Dán dân dân. Dán dân dân. Dân dân dân dân...
- Honoláveis visitantes de outlas tellas. Aploximem-se. Não tenham medo que ninguém ilá comê-los. Somos vegetalianos. Sejam bem vindos a minha humilde fáblica. Sei que possuem muitas peroguntas, mas cada coisa a seu tempo. Plimeilamente quelia me descuparo pela sua samambaiação e bundchenção. Aquilo saiu fola de meu contlole. Poro isso mandei meu soldados pala lesgatá-los antes que fosse tarude, mas vocês matalam a todos. Isso foi muito cluel e insensível, mas estão peroduados...
- Ih! Foi luim mesmo Honolável... – inicia o Sargento.
- Honorável. Diga Honorável Mijaru Nakombi. Não precisa usar sotaque como se estivesse conversando com neném, pois ele é japonês, não retardado mental. – corrige Tomagoshi.
- Ih! Foi mal! Honorável Mijaru. – pede desculpas o Sargento, ainda sentindo pedaços de ramos de samambaia dentro da boca e um pedaço de outra coisa entalada nas partes baixas.
- Não plecisa se desculparo. Sei que estão cansados e poro isso peço que só converosemos amanhã sobre tudo. A não sero que estejam muito culiosos e decidam doromiro mais tarude...
- Pode crê! Não estou entendendo nada. Queria saber algumas coisas ainda agora, se for possível. – observa o Sargento.
E assim, Mijaru Nakombi começou sua pregação sobre os mistérios da vida, o sobe de desce da bolsa, as fantásticas fantasias eróticas de gueixas profissionais, o mercado de câmbio internacional e a queda do dollar, sushi, sushimi e tofú, as necessidades humanas, a fabricação de shoyu e os segredos mais profundos de uma japonesa que decide escorregar pelo corrimão da escada para mostrar que não é rachadura horizontal.
Falou sobre tudo. Desde o início da vida até o final dos tempos. A criação da luz, o surgimento das trevas. O abismo entre os homens, a ordem espacial, o caos social, tudo, tudo e mais tudo. O Sargento e o Tenente já não se agüentavam mais em pé, mas nada do Numsei parar de falar. Até Tomagoshi, vez ou outra, gesticulava para ambos, ao enfiar a mão na boca insinuando que queria vomitar. Parecia que aquele japonês estava tão solitário quanto o mais solitário japonês abandonado em uma ilha pacífica do Pacífico sem saber que a 2ª Guerra havia acabado. Solitários de seus próprios mundos que queriam extravasar para novos rostos. Por a boca no trombone e bater um papo de quando em vez...
- E é isso... – aparentemente finaliza o grande Mijaru.
- Mas só? – pergunta e arrepende-se logo em seguida o Sargento, imaginando que o japinha poderia engatar uma segunda e falar ainda mais sobre tudo, tudo, tudo e mais tudo...
- Não honolável Salgento. Tem mais, muito mais. Mas isso que falei até agola foi só pala mostlaro como sou culto. Não tem nada a vero com vocês aqui. Foi só papo fulado pala vero se plestavam atenção e estavam plepalados pala a glande revelação...
- Então isso “ela só pala testaro nosso saco” honolável Nunsei? Olha Mijaru! Isso não é filme de Kung-Fu, onde mestre e gafanhoto ficam a divagar pelos sentidos humanos, tentando descobrir se um homem com 4 bolas entre as pernas é super-homem ou se está sendo enrabado. Queremos respostas! – impõe o Sargento, seguido se seu fiel escudeiro Tenente.
- Mas respostas de que se não fizelam peroguntas?
- Ih! Essa doeu hein Sargento. – comenta o Tenente...
- Tá bom! Afinal que lugar é esse? – fala o Sargento
- Uma fáblica! Plóxima perogunta.
- Que é uma fábrica eu já percebi. Mas de que?
- De água! Outla perogunta.
- Mas fáblica de água na Amazônia? Perdão! Fábrica de água na Amazônia? Então engarrafam água, é isso?
- Não! Outla perogunta.
- Peraí. Essa não valeu. Foi quase uma afirmação minha. Mas se não engarrafam água, como é uma fábrica de água?
- Outla perogunta!
- Perai denovo! Ainda não respondeu. Por que não responde?
- Porque não! Outla perogunta!
- Savagem grande Nakombi. Quero saber tudo...
- Está bem gafanhoto! Vou contaro a verudade. Mas depois terei que alancar seus olhos com anzol, furaro seu ouvido com valinha de bambu, tiruturar sua língua em moedolo de carune, esmagaro seus dedos com alicate de perussão, corutaro seus bagos com faca cega e enfiaro um supositólio de meio metlo no seu leto dileto e leto sem cholo nem vela...
- Caracas! To fora!
- To dentro Sargento! To dentro! Deixe que eu pergunto. – intervém o Tenente saltitante de alegria.
- Calma lá Tenente. Antes do supositório, ele vai...
- Eu sei, eu sei... Mas minhas hemorróidas estão mais necessitadas do que todo o resto. Há dias que elas estão latejando e depois que comecei a me transformar em Giselle o negócio piorou, pois além de lajetar, ainda começou a pulsar como se estivesse se exercitando....
- Calma lá digo eu, Honoláveis visitantes. Foi só uma blincadeilinha. Sou contla a violência e tô fola de supositólio...
- Então manda Honorável.
- Então vou começaro pelo começo...
- Ah não! De novo não. Já sabemos o começo. Pula essa parte.
- Calma gafanhoto! A plessa é inimiga da perofeição!
E assim foi. Com os olhos arregalados, o Sargento e o Tenente começaram a ouvir atentamente a história de Mijaru. Explicou que aquela fábrica havia sido instalada há muito tempo na Amazônia pelos kamikases que fugiram das missões aéreas suicidas do Pacífico Norte e que haviam sido dado como mortos e condecorados como heróis de Guerra pelo alto comando militar. Afirmou que um comboio aéreo havia se deslocado para aquele lugar inóspito com um único propósito: viver em paz e harmonia.
À medida que contava seu relato, os visitantes ficavam cada vez mais embriagados pela brava história de desbravamento da Amazônia em busca do paraíso e do desenvolvimento de um vilarejo auto-sustentável com aquilo que a floresta podia lhes oferecer. Como japoneses que eram, começaram a cultivar hortaliças e criar enormes tanques de peixes, mas a evolução da raça humana exigia cada vez mais e mais para sua sobrevivência. Criaram então um plano estratégico de apropriação tecnológica de outros povos e mandaram seus jovens japoneses para todos os quatro cantos do planeta para absorver conhecimento e retornar para desenvolver sua comunidade...
- E assim quando voltalam tais jovens com todo o conhecimento do mundo, começamos uma longa jorunada rumo a identificação de nossas potencialidades, das vantagens competitivas com outlos povos e aglegação de valoles em nossos plodutos. Decidimos então, depois de pensarumos muito, que não falíamos miclo-chips, vídeo-cassete e essas bobeilas do mundo moderuno, até poruque a Zona Flanca de Manaus já fazia isso...
- Então decidilam, desculpe, decidiram fazer o que?
- Qual o bem mais plecioso da humanidade?
- Ouro!
- Não, o bem mais plecioso da humanidade?
- A fé!
- Não bulinho! O que todo mundo plecisa pala viver?
- Comida!
- Ah! Mais que comida. Algo que não pode faltaro de jeito nenhum na vida?
- Sexo! – respondeu o Tenente!
- Puta que paliu. Poro isso que são teroceiro mundo. Água seus imbecis. Água! Somente x % que não me recorudo agola é água potável. O lesto é salgada. Estudalam isso?
Por um momento o Tenente e o Sargento ficaram de garganta seca. Por isso uma fábrica de água na Amazônia. Mas isso não seria criativo, pois fábricas de água no Brasil existem aos montes e mais uma não faria sucesso, a não ser que possuísse um diferencial...
- E para quem vendem a água produzida aqui? Pala o mundo inteilo, gafanhoto Salgento. Mas não ploduzimos água! Ploduzimos soja e vendemos água. É difelente gafanhoto.
- Agora que não entendi mesmo. Pode ser mais claro.
- Cerutamente gafanhoto.
O processo era simples... Para se produzir soja é preciso uma enorme quantidade de água para irrigação. Água para cacete. Oras! Um país que compra soja produzido em outro país, na realidade está comprando água a preço de soja, pois deixará de utilizar seus mananciais para produzir aquilo que pode ser cultivado em países que não se preocupam com suas reservas fluviais, pois acham que as possuem em abundância.
- Estamos bestificados... – observam os visitantes
- E tem mais, honoláveis ignolantes da aglicultula...
Não bastasse a água que é economizada no país comprador, a soja geneticamente modificada fora criada para absorver mais e mais água em seu interior protegida por uma casca impermeável que evita a evaporação do líquido e a hidratação do produto até seu destino. Como é geneticamente modificada, uma transgênica perfeita, possui propriedades do pulgão – aquele bichinho que chupa sem parar - para absorver o máximo de água do subsolo, além do cactus, que impossibilita que o grão se estrague durante longos períodos de armazenamento e transporte para o destino. Assim, além dos países desenvolvidos não gastarem a escassa água para produzir soja, podem espremer os grãos e conseguir mais água potável para suas limitadas reservas de água.
- Poro isso nossos garãos são mais pesados, maioles e com melhoro aceitação no merucado interonacional. Em média cada garão leva 20ml de água amazônica flesquinha supero compactada plonta pala sero esmagada quando chegaro no destino. Poroduzimos água de soja. Nada de shoyu e comida natuleba. Isso todo mundo faz. A natuleza faz água de coco. Nós japoneses, que já cliamos a melancia quadlada e o alicate de cutícula com lupa de aumento, somos os únicos a poroduziro água de soja... Nosso slogam é “Sósoja mata sua sede”...
- Puta que o pariu! Por que não pensamos nisso antes?
- Poruque só os japoneses tem cinco anos de galantia...
- De Copa a Copa, não é verdade?
- Valias Copas Gafanhoto. Mas nos vimos envolvidos por uma ameaça interunacional de aplopliação interunacional do telitólio amazônico. Válios países queliam lotearo essas bandas e decidimos cliar um clima de enflentamento, com espiões infiltlados em valios glupos de chefia para tomada de assalto da nossas tellas. Digo, tellas do blasileiros...
Depois desse papo todo, o que eles precisavam era de um descanso. Ninguém aguentava aquele papo de japonês tanto tempo. O tenente chegou a dar umas cochiladas, levando várias cotoveladas do sargento. Mas enfim, foram convocados uns japonesinhos para levarem eles para seus quartos. No quarto do tenente tinha até ofurô.
- Furô o quê?
- Ofurô, tenente.
- Hum, mas assim, do que é que nós estamos tratando aqui?
- É uma banheilinha reflescante.
- Uma banheilinha?
- É. Reflescante. Muito reflescante.
- Mas se é tão reflescante, porque é que tá saindo fumaça?
- Plimeilo esquenta, depois reflesca.
- Ah, sei.
O tenente resolveu experimentar. Esperou o japonesinho sair, tirou a roupa e entrou no ofurô.
- Esses japonesinhos, viu... Uma banheira que nem dá para esticar as pernas...
Alguns quartos adiante, eles estavam tentando ajeitar o sargento.
- O meu eu quero sem ofurô.
- Mas salgento, ofurô é bom, relaxa as pelnas.
- Pelnas? Mas você é japonês ou é o Cebolinha?
- Japonês, salgento, nascido e cliado.
- Bem, não importa, eu não quero essa frescura aí de ofurô. Só quero uma cama para dar uma descansada e mais nada.
- Mas o salgento não vai toma um banho?
- Não, não vou.
- Nem pla dá uma leflescadinha?
- Não.
- Bem, então a gente vai ter que apelá.
- Ei, espera aí, me soltem, o que é que vocês pensam que estão fazendo?
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